O Barco é uma intervenção artística que foi criada pelo Coletivo em 2011, ao lado de comunidade da região do Jardim Pantanal, próxima ao Rio Tietê, na zona leste. Foi feita durante o projeto À Deriva Metrópole São Paulo, em que o Coletivo percorreu bairros do centro e das extremidades da cidade. Realizamos derivas, conversas, entrevistas para conhecer sobre as histórias de formação desses bairros.

JD. PANTANAL E UNIÃO DE VILA NOVA

As comunidades da região do Jd. Romano, Vila Mara e Jd. Helena resiste desde 2009 quando começaram as enchentes planejadas pela gestão de recursos hídricos do Estado de São Paulo que, diante das chuvas de verão, optou por fechar as comportas da barragem da Penha, protegendo o fluxo de automóveis na marginal Tietê, porém alagando por dias um bairro inteiro. Por ocuparem uma região de várzea de rio, os moradores sofreram muita pressão por parte do governo acusados de crime ambiental. Porém, empresas e instituições como a Bauducco, a USP Leste e o Centro de Treinamento do Corinthians também foram construídos na região de várzea de rios e a eles, claro, foi dada a preferência. Moradores organizados apresentaram uma proposta de urbanização que não foi aceita. Parte da região continua sendo chamada pelos habitantes de Jd. Pantanal.

Na região da União de Vila Nova, os antigos moradores chegaram na região alagadiça e tiveram que aterrar para construir suas próprias casas. Depois de muita luta para melhorar o bairro, em meio a muita violência e assédio eleitoreiro, chegou a CDHU para finalmente fazer melhorias da urbanização, já começada pelos moradores. Hoje o bairro conta com vários espaços comunitários: uma horta que incentiva o comércio local, produz vegetais sem agrotóxicos, promove cursos; espaço de atividades culturais e educativas; cooperativa de reciclagem iniciada por moradores, envolvida com a luta do movimento dos catadores e que busca promover a autogestão; Depois de muitas décadas de aterramento e urbanização, os habitantes não se identificam com o nome Pantanal.

Após ouvir essas histórias dos moradores o Coletivo criou, em 2011, um barquinho sobre rodas para “navegar” por essa região. Foi construído com a participação de vários moradores usando material reaproveitado e de ferros-velhos locais.

A intervenção do Barco aconteceu em União de Vila Nova e dias depois no Jardim Romano. A ação artística teve como elemento principal a integração e comunicação com os moradores. O barco foi veículo e instrumento de relação entre as pessoas em torno das questões de seu bairro. Alguns moradores sentavam no barco para contar histórias do local para as crianças.

BIXIGA

Em 2013, a convite da Casa de Dona Yayá – Centro de Preservação Cultural da USP, a intervenção navegou pelos rios do bairro do Bixiga que, apesar de canalizados e escondidos sob o asfalto, ainda fluem em direção ao Anhangabaú. A Oficina Trafegar pelos rios do Bixiga propiciou três cortejos pelos Rios Japurá, Itororó e Saracura, demarcando simbolicamente o exercício artístico-ético que indaga: que cidade construímos ou aceitamos ser construída? Ao término da oficina e fruto de suas vivências, o Bloco Fluvial do Peixe Seco foi criado pelos participantes do processo e, desde então, ampliou navegações por outras águas paulistanas.

BLOCO FLUVIAL DO PEIXE SECO
No final de 2013, ao término das atividades da Oficina Trafegar pelos rios do Bixiga, realizada na Casa de Dona Yayá entre outubro e novembro, os participantes decidiram continuar as navegações por outros rios da cidade e criaram o Bloco Fluvial do Peixe Seco. Em março de 2014, durante o Carnaval de rua da cidade, o cortejo – escavação “navegou” pelo Rio Saracura, partindo da Praça 14 Bis no Bairro do Bixiga, fluindo pela Av. Nove de Julho até desembocar no Vale do Anhangabaú. Em fevereiro de 2015, também durante o Carnaval, seguindo o fluxo do Rio Anhangabaú, o barco partiu do Vale até desaguar no Rio Tamanduateí, escondido entre os muros de contenção da Av. do Estado. Em agosto de 2015, ao lado do Movimento Terra Livre, o barco retornou ao Jardim Pantanal. Lá, o Bloco Fluvial do Peixe Seco participou da organização do Sarau do Cotovelo, no qual realizou um trajeto margeando o Tietê e ouvindo as histórias de resistência de seus moradores.

O Bloco conta atualmente com 15 integrantes e eventuais colaboradores em seus trajetos fluviais pela cidade. Com um barco sobre rodas, uma bicicleta sonora, letras compostas coletivamente para cada rio percorrido e intervenções urbanas pelos trajetos, o bloco, de forma festiva, traz à tona percepções sobre os projetos de cidade que se sobrepõem a vontades e usos de boa parte da população. O barco segue, questionando a correnteza e poetizando o cotidiano.